Uma experiência de ressonância

Morando tão longe de casa, há dias em que sinto uma saudade enorme da nossa língua. No começo, depois de um dia inteiro pensando e me esforçando para me comunicar em polonês eu chegava em casa incrivelmente cansada. Tudo que eu queria era não pensar em nada. Eu tinha a sensação de que tinha exaurido toda a minha capacidade cerebral disponível. Felizmente, depois de um tempo, essa sensação de exaustão passou, mas a saudade do português não.

Aqui na Polônia é difícil encontrar livros no nosso idioma. Por isso, fiquei muito feliz quando ganhei dois livros incrivelmente inspiradores no meu aniversário. Entre eles estava O clube de leitura de Jane Austen. O livro já era familiar para mim, pois havia assistido ao filme de mesmo nome com Gigi. Achamos toda a idéia de se reunir com os amigos para discutir nossos livros favoritos fantástica e divertida. Por que não havíamos pensado nisso antes?

Há alguns anos atrás, logo depois que assistimos ao filme, fomos comentando a idéia com nossos amigos. Cada um à sua maneira tinha muito contato e interesse pelas artes e todos ficaram bastante animados! Temos a sorte de ter amigos maravilhosos. Sentimos muitas saudades de cada um deles, pois devido às nossas inquietudes geográficas, muitos de nós nos mudamos para uma cidade diferente. Muitos até mesmo para um país diferente, como foi o meu caso. Felizmente, tivemos a oportunidade de compartilhar uma época juntos em Curitiba. Foi nesse período que fundamos o clube de leitura Máfia entre Livros.

Lembro-me com muito carinho dos nossos encontros. Era como se os relógios da nossa rotina corrida parassem e pudéssemos falar daquilo que nos move de verdade. É como se víssemos refletidos nos personagens e nas histórias dos livros alguns aspectos de nossa própria experiência. Celebramos com eles as nossas vitórias. Choramos com eles as nossas perdas. E com Proust revisitamos nossas memórias. A partir dessa visão externa que a literatura proporciona, conseguíamos falar mais abertamente daquilo que nos emociona, daquilo que buscamos e também daquilo que agrega peso aos nossos ombros. Era como se observando as reações dos personagens, pudéssemos também criar novas atitudes e resoluções para nossa vida.

De forma geral, nos encontros cada um comentava os aspectos que mais lhe tocaram durante a leitura. Se você lê bastante, sabe que geralmente os livros nos tocam nos pontos mais sensíveis da nossa alma. É aquele momento durante a leitura em que temos certeza absoluta de que o autor escreveu essas linhas para nós – o que, dito de outra maneira, significa que sabemos que não estamos sozinhos, que não somos os primeiros e únicos a passar por isso. E que bom que existem pessoas talentosas que conseguem transpor em palavras o que está em nosso peito, mas que até aquele momento não conseguíamos descrever!

Em grande parte nossos encontros eram tão especiais, porque tinham um caráter intimista. Nós éramos um grupo pequeno e nos sentíamos seguros para compartilhar nossos sentimentos e questionamentos mais profundos. Acho que a palavra que melhor descreve essa sensação é ressonância. Essa possibilidade de troca, de conexão sem interesse. Acho que todos nós ansiamos por experiências reais, que nos façam sentir vivos, que nos tirem do piloto automático da rotina. Afinal, nós todos temos as nossas atividades e afazeres. A questão é o que nos move? Nesses encontros, nossos amigos e a literatura nos aproximavam de uma resposta.

Se você quiser saber mais sobre o clube de leitura Máfia entre livros, confira o blog do clube em https://mafiaentrelivros.wordpress.com. Se você tem vontade de participar de um clube de leitura, deixe nos comentários. Vamos ficar muito felizes! Quem sabe podemos começar uma nova edição?

A resonance experience

Living so far from my home country, there are days when I miss a lot my native language. At the beginning, after an entire day thinking and struggling to communicate in Polish I would arrive at home incredibly tired. All I wanted was to empty my mind. I had the feeling I drained out all my mental ability. Happily after some time this impression went away, but I still miss a lot Portuguese language.

Here in Poland it is not easy to find books in my language. For this reason, I was extremely happy when I received two very inspired books in my birthday. Between them, there was The Jane Austen Book Club. This book was already familiar to me. Gigi and I have watched the movie together some years ago. What a fantastic idea to gather together with friends to talk about our favourite books! Why haven’t we thought about it before?   

Soon after watching the movie, we shared the idea with our closest friends. Each of them had contact and interest in arts and from the beginning they got very excited! We are lucky to have wonderful friends. We miss a lot each of them, especially the ones who are far away. Due to our geographical restlessness, many of us moved to a new city, many even to a different country, which is my case. But luckily we had the opportunity to share a period all together in Curitiba, when we founded the Máfia entre Livros Book Club.

I remember our meetings with deep fondness. It was like the clocks of our fast and crazy routine stopped for a while and we could talk about what really drives us. It was like we saw some aspects of our own experience reflected in the characters in the books. We celebrated with them our victories. We cried with them our losses. We revisited our memories with Proust. From the external point of view offered by literature, we could talk more openly about what moves us, about what we are looking for and about the weight we carry in our shoulders. It was like by observing the characters reactions we could also find new attitudes e resolutions for our life.

In general, in every meeting each of us would comment the aspects which touched us most during the reading. If you read a lot, you know that often the books touch us in the most sensitive parts of our soul. It is that moment during the reading when we are absolutely sure that the author wrote these lines for us – in other words, it means we know that we are not alone, that we are not the first ones to pass through it. And how wonderful we have these talented people, who are able to translate into words what is in our heart, but we couldn’t describe before!

Our meetings were so special because of the intimacy they provided. We were a small group and we felt secure to share our feelings and deepest questions. I think that the best word to describe this is resonance – this possibility of sharing, of connecting with other people with no interest. I believe we all long for real experience, the kind of experience that makes us feel alive, that takes us from the autopilot of our routine. After all, we all have our tasks and activities. The question is what really drives us? In our meetings, our friends together with literature would bring us closer to the answer.

If you want to know more about the Máfia entre livros book club, check the blog https://mafiaentrelivros.wordpress.com. If you are willing to take part of a reading club, let us know in the comments. Maybe we can start a new edition!

Share:
Written by Ca Amatti
Ca Amatti é arquiteta restauradora, apaixonada pelos edifícios antigos, por viagens e artes gráficas. Tem saudades do futuro, mas ama os vestígios do tempo no mundo. Atualmente reside em Varsóvia, protegendo velhos palácios e monumentos dos efeitos devastadores do tempo e do esquecimento.