Sobre encontrar a beleza nas imperfeições

Ultimamente tenho refletido bastante sobre o que significa ser autêntico. Em tempos em que o contato com as pessoas passou a ser mediado pelas telas dos nossos computadores e celulares, nos habituamos a acompanhar a vida dos nossos amigos e colegas pelas fotos e notícias publicadas nas redes sociais. Esse ato se tornou tão banal, que às vezes esquecemos que essa é apenas uma parte de suas vidas, geralmente aquela mais positiva e a qual se sentem felizes em compartilhar.

Afinal, ninguém gosta de compartilhar publicamente os seus problemas e fracassos, seus sentimentos mais sombrios. Isso é natural. No entanto, essa publicidade seletiva e excessiva acaba gerando um problema paradoxal – ao mesmo tempo em que expomos a melhor parte de nossa vida, existe por outro lado a sensação de que nunca somos bons o bastante, a sensação de que nunca estaremos próximos o bastante do padrão que deveríamos alcançar.

É o que a autora Brené Brown chamou em seu livro A coragem de ser imperfeito do problema da escassez. Acredito que muitos assim como eu já se pegaram pensando com frequência “não dormi o bastante”, “hoje não vou ter tempo suficiente para fazer tudo que tinha planejado”, “não me exercitei o bastante”. É aquela sensação de já estarmos para trás antes mesmo de termos começado. Mas por que nos sentimos assim, por que esse sentimento de não suficiência surge para nós de forma tão automática?

Brené Brown aponta nessa leitura reveladora três fatores que colaboram para a sociedade da escassez: a vergonha, a comparação e a desmotivação. Todos eles estão na verdade ligados ao receio da humilhação de no fundo ser alguém comum e ao medo de errar. E todo esse círculo vicioso de pensamento só vem a ser reforçado pelos padrões inatingíveis propagados pela mídia.

Mas e se nós pudéssemos abraçar tudo aquilo em nós que vemos como falhas? Se pudéssemos mudar o nosso olhar, visualizando em primeiro lugar aquilo que somos e aquilo que temos, ao invés de focar naquilo que nos falta? Não estaríamos então sendo verdadeiramente autênticos e mais plenos?

Num post sobre palavras intraduzíveis Gigi escreveu sobre a palavra japonesa wabi-sabi, que significa encontrar beleza nas imperfeições. Perceber o encanto do inesperado. Para sairmos do paradigma da escassez é preciso viver com ousadia, desconstruir hábitos e padrões. É preciso aceitar que a vida tem seus altos e baixos e que errar é parte importante dos nossos processos de aprendizado.

Quem nunca viu uma criança pequena mostrando seus machucados com orgulho – as cicatrizes mostram que sobrevivemos às quedas, que apesar delas seguimos em frente. Se não tolerarmos nossos próprios erros, dificilmente teremos coragem de tentar algo novo, preferindo sempre se manter na segura zona de conforto. Principalmente em áreas ligadas à criatividade e à inovação, assumir o risco de falhar de vez em quando é essencial.  

O que você faria se não tivesse medo?

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Written by Ca Amatti
Ca Amatti é arquiteta restauradora, apaixonada pelos edifícios antigos, por viagens e artes gráficas. Tem saudades do futuro, mas ama os vestígios do tempo no mundo. Atualmente reside em Varsóvia, protegendo velhos palácios e monumentos dos efeitos devastadores do tempo e do esquecimento.