Os Campos Gerais sob a luz de Saulo Pfeiffer

Numa das nossas correspondências digitais, pouco antes da minha viagem ao Brasil, Gigi me contou sobre o trabalho de dois artistas de Ponta Grossa, o pianista e compositor Newton Schner Junior (vocês vão saber mais sobre o Newton num próximo post) e o pintor Saulo Pfeiffer.  É uma sorte que nos dias de hoje a internet pode nos aproximar da arte da nossa terra mesmo quando a gente está longe. Meu coração viajou com saudades ouvindo as músicas ao piano de Newton e foi com imensa alegria que reconheci nas obras de Saulo as ruas e detalhes tão particulares da cidade da minha infância e juventude.

Veja nesse vídeo de divulgação de uma exposição do artista algumas obras de Saulo Pfeiffer, tendo como trilha sonora a música de Newton Schner Jr

A primeira tela que me encantou foi uma vista da rua Francisco Ribas. É uma rua estreita, na tela há alguns carros, vemos que a pista está molhada da chuva. Mas o que chama mais a nossa atenção é uma árvore enorme que, para alcançar a luz, cresceu torta contornando a fachada do prédio onde foi plantada. Talvez pela minha descrição pareça uma cena urbana banal. Mas essa é a cena que vi tantas vezes ao sair da casa de minha avó. E desde que eu era pequena essa árvore desperta a minha curiosidade e admiração – como é que ela conseguiu crescer tão forte e frondosa, qual o seu segredo para superar os obstáculos que lhe foram impostos?

Se você é pontagrossense, com certeza já fez esse caminho muitas vezes e acredito que ao menos uma vez, esperando o sinaleiro abrir, já parou observando surpreso essa árvore. Não conheço arte mais forte do que essa – que faz vibrar as nossas memórias, que ressoa em nós e que nos revela que não estamos sozinhos neste mundo. Acho importante falar sobre isso. Às vezes a gente tem a tendência de achar que a grande arte está nos museus famosos, que a arte, para ser boa, tem que ser complicada, conceitual, que só pode ser entendida por poucos.  Para mim, a grande arte é direta, ela não precisa de explicações. Ela mexe com você e pronto. Ela é autêntica.

Fiquei muito feliz de nos poucos dias em que estive em Ponta Grossa poder visitar a exposição organizada na galeria de arte da Pró-Reitoria de Extensão da Universidade Estadual de Ponta Grossa (PROEX – UEPG). Era o último dia da mostra, estávamos apenas mamãe, Gigi e eu, e foi uma experiência realmente incrível. Mamãe reconheceu as paisagens em que ela e papai andavam de moto quando eram ainda namorados nos arredores da cidade. Eu reconheci a igreja do meu casamento. E, para a nossa surpresa, o próprio Saulo apareceu na exposição e foi um prazer conhecê-lo e saber um pouco mais sobre o seu processo de criação e seu caminho de intensa pesquisa pessoal.

O que mais me encanta nessas obras, além da escolha de cada cena, é a forma como a luz é expressa, sempre muito vibrante – seja retratando um dia de sol pleno, um entardecer chuvoso, uma tempestade que se aproxima ou o sol que saiu logo depois da chuva. Os quadros dos ipês em flores me fizeram recordar uma lembrança há tempos esquecida. De quando saí de casa uma vez logo após a chuva. Lembro de como as cores dos ipês floridos estavam ainda mais vibrantes devido à tonalidade acinzentada com que a chuva cobriu todo o resto. Lembro que naquele dia pensei que a cena era tão linda que merecia um lugar na memória. Visitar a exposição trouxe essa lembrança à tona 🙂 Só tenho a agradecer ao artista! E aguardo ansiosa pela próxima exposição.

 

Mamãe e eu junto com o artista.

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Written by Ca Amatti
Ca Amatti é arquiteta restauradora, apaixonada pelos edifícios antigos, por viagens e artes gráficas. Tem saudades do futuro, mas ama os vestígios do tempo no mundo. Atualmente reside em Varsóvia, protegendo velhos palácios e monumentos dos efeitos devastadores do tempo e do esquecimento.