Céu encantado polonês – última parte
Devaneio felliniano
Iwonicz Zdrój inspirou-nos uma aventura. O grupo está abandonando o guia. Logo o trocarão por um girassol amarelo, como os chineses. Viva o anarquismo! Morte ao maestro! Fugimos do grupo para desvendar a cidade. Camila teve acessos arquitetônicos e fotografou milhares de casas de tronco e lambrequins – arquitetura tradicional eslava também vista no sul do Brasil.
Porque abraçamos a anarquia de Fellini? Não conhecemos as minas de sal, a Częstochowa (padroeira da Polônia) e quase não passamos por Cracóvia (segundo a historiadora de Arte que conhecemos em Nowy Sacz, Anna Duda, Cracóvia é o coração da Polônia. A cidade que nunca dorme, com as piroguerias e o agito dos jovens).
O anarquismo acompanhava os espíritos das jovens e dos senhores brasileiros da excursão. Foi fácil convencer o guia a nos levar para Cracóvia. Após algumas conversas particulares, o homem ainda se mostrava reticente. De repente, um grito tímido surgiu do fundo do ônibus: Cracóóóvia! Cracóóóvia! E mais vozes juntaram-se a ele. Em poucos segundos o ônibus todo vibrava ao som de uma única palavra. Resultado: passamos uma linda tarde na cidade.
Conhecemos o castelo. A estátua do dragão – personagem de uma das lendas polonesas. Visitamos a maior praça medieval da Europa. A Cidade Velha de Cracóvia. Acordeonistas interpretavam uma fuga de Bach em frente à Igreja de Santa Maria. Ou, como se diz na Polônia, a Igreja Mariacki. Gótica. Com duas torres – uma delas nunca terminada. Palco de uma conhecida lenda polonesa.
Século XIII. No alto da torre, um trompetista marcava as horas do dia com o som de seu instrumento. Em uma madrugada, o músico não conseguia dormir. Ao subir na torre, o trompetista avistou os inimigos tártaros a caminho de invadir a cidade. Com o toque de seu trompete, os habitantes de Cracóvia acordaram para defender sua terra. O trompetista morreu. Mas até hoje, em homenagem ao homem que lutou por sua cidade, músicos soam seu trompete do alto da Igreja Mariacki
Não podemos esquecer também da cidade medieval de Gdánsk, um porto voltado para o Mar Báltico. Nessa região, próxima ao hotel que ficamos, está Westerplatte – aonde começou a Segunda Guerra Mundial. O primeiro bombardeio, em 1º de setembro de 1939. Dos 206 soldados poloneses, apenas 15 morreram. Os poloneses representavam 1/3 da quantidade de soldados alemães. Sete chamas para sete dias de defesa. A espada enterrada na terra representa o fim da guerra. Em 2007, caminhando por Westerplatte, ninguém imagina que houve bombardeios… Calmaria. Vimos um misterioso farol.
Voltamos à Varsóvia após o vento gélido do Mar Báltico. Dançamos em meio às ruínas de um castelo e sob o céu estrelado. O tempo parou apenas para saborearmos aquele instante. Instante em que passado, presente e futuro se encontraram. Culminaram em luz. Gratidão. E assim terminou nossa aventura na terra de nossos antepassados. Congelada no tempo, sob o céu encantado polonês.