Sobre aeroportos

Eu sempre fui fascinada por viajar de avião. Mas teve uma época em que eu fui mais. Foi logo depois da minha primeira viagem. Eu tinha 17 anos e havia ganho uma bolsa para uma viagem de estudos pelo Val Camonica, um vale lindo no norte da Itália de onde vieram meus antepassados. Eu não fazia ideia de como era complicado todo o processo de check-in, despacho de bagagem, imigração… lembro que papai foi comigo até São Paulo e depois uma espécie de tutora me ajudou a passar por essas etapas. Quando ela me deixou no aeroporto de Milão e eu vi a placa EXIT/USCITA não tive dúvidas de que era para lá que eu deveria ir, onde o amigo de meu avô estaria esperando por mim.

O único problema era que eu não sabia que precisava pegar a minha mala antes de sair. Então imaginem que ao encontrá-lo eu estava mais do que feliz por tudo ter dado certo, mas ele ficou muito preocupado porque não viu nenhuma mala. Ele perguntou algo como: “mas você não pegou a sua mala?” E eu respondi surpresa: “Mas eu não deveria pegar ela agora?” Até hoje não sei como conseguimos entrar novamente na área da retirada das bagagens para resgatar a minha mala, mas deu tudo certo no final. Pois é, quem me vê viajar hoje não imagina que já passei por alguns fiascos desse tipo, entre outros… Eu lembro nitidamente de como essa primeira viagem foi fascinante para mim. O avião acelerando antes de levantar voo e as vistas magníficas lá de cima. Lembro de que em algum momento do voo eu me perguntei se aquilo tudo era real, pois era tão fascinante, que achava difícil de acreditar.

Eu nunca imaginei que depois daquela primeira viagem haveria tantas outras. É verdade que eu me apaixonei imediatamente pela Itália e por muitos anos nutri o sonho de ir viver lá, mandando todos os meus pertences de mudança em um contêiner a ser retirado em Gênova. Estava tudo planejado e tudo seria lindo. Mas esse sonho acabou dando lugar a outros. E quando eu me deparei com a possibilidade de mudança para a Polônia, uma mudança concreta e real, o sentimento foi completamente diferente. Eu já não queria levar tantas coisas e acabei deixando ou me desfazendo de muitos pertences, incluindo um piano. O limite de bagagem está sempre diminuindo e para despachar é caro e leva muito tempo…

E então vivendo fora agora, as viagens se tornaram relativamente frequentes, mas adquiriram um novo significado. Antes me sentia um pouco como uma exploradora – minha parte favorita era a decolagem, aquela sensação da aventura que estava por vir. Buscava sempre sentar na janela para ter as melhores vistas, me emocionava com as turbulências! (Eu sei, eu era meio louca…) Hoje, meu coração anseia mesmo é pelo momento do pouso. É verdade que se passaram alguns anos e aquela coragem do início às vezes dá lugar a um medinho lá em cima quando o avião está um pouco instável. Hoje já procuro sentar no corredor, pois é mais confortável e posso levantar quando quiser sem incomodar ninguém. Se antes viajava para conhecer os lugares, hoje as melhores viagens são aquelas para reencontrar, matar as saudades, agradecer às raízes. Para chegar ao aeroporto do destino e ver aqueles sorrisos tão familiares – o brilho nos olhos.

Para Marc Augé, os aeroportos compõem parte da experiência da supermodernidade, são o que ele denominou de não-lugares: lugares impessoais, de passagem, lugares em que, embora o indivíduo precise o tempo todo comprovar a sua identidade, ele não passa de mais um dentro de um complexo sistema de fluxos, procedimentos e controles. De certa forma, tudo isso não deixa de ser um pouco verdade. Mas eu acabo vendo os aeroportos como grandes portais que nos levam para qualquer lugar, como se fossem uma versão ainda primitiva da futura máquina de teletransporte. Para mim, acabaram se tornando lugares muito nostálgicos. Quando volto para um deles, sempre relembro do que já passei ali – dos reencontros, despedidas, sonhos, aventuras, olhares brilhantes e malas perdidas…

E você, qual o seu sentimento em relação aos aeroportos?

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Written by Ca Amatti
Ca Amatti é arquiteta restauradora, apaixonada pelos edifícios antigos, por viagens e artes gráficas. Tem saudades do futuro, mas ama os vestígios do tempo no mundo. Atualmente reside em Varsóvia, protegendo velhos palácios e monumentos dos efeitos devastadores do tempo e do esquecimento.