Pequena homenagem ao grande mentiroso

O documentário Só dez por cento é mentira já revela no comecinho que o famoso Manoel de Barros veio ao mundo com uma anomalia incurável – nasceu poeta. Fiquei tão triste quando soube de seu falecimento, em 13 de novembro. Esse post é uma pequena homenagem a esse grande admirador dos desperdícios e pequenezas da vida.
Conheci o poeta pantaneiro aos 15 anos, quando ganhei de presente dos meus pais o livro “Memórias inventadas – Infância”. A obra é literalmente uma caixinha com memórias e iluminuras (essas produzidas pela filha do poeta, Martha Barros)! As páginas são soltas e contam um pouquinho da infância de Manoel: como ele quis ser escovador de palavras, como aprendeu a admirar a terra e os seres desprezados com a avó, como descobriu que seu quintal era maior do que o mundo…
É tão difícil falar da obra de Manoel, porque as palavras são tão honestas e cheias de sutilezas, simplicidade e doçura. Como o próprio poeta apontou quando foi entrevistado no documentário Só dez por cento é mentira: “É preciso incorporar a poesia, e não entendê-la”. E em Memórias Inventadas ele nos mostra o mundo a partir do olhar da criança. Nós vemos o pequeno, o ínfimo, a importância das coisas que são jogadas fora… Vemos que o olhar infantil transfigura o mundo, acompanhando a fala do coração e dos sonhos. A gente também descobre algumas invencionices infantis: o esticador de horizonte, o abridor de amanhecer, o alicate cremoso…
Nada é impossível para um homem que só teve infância e que admitia ser um “vagabundo profissional”. O que faz um vagabundo profissional? O poeta contou no documentário que esse profissional fica à toa, ou seja, fica à disposição da poesia.
Porque a poesia é uma artesania que aumenta o mundo. Que liberta o olhar e ensina a gente a observar a vida com uma lente de aumento, percebendo todos os pequenos detalhes e momentos maravilhosos que vivenciamos todos os dias.
PS: Ensaios fotográficos também é uma leitura emocionante (e também o único livro de prosa do poeta), recomendo!
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Written by Gigi Eco
Gigi Eco ama aprender e faz muitas coisas ao mesmo tempo - é jornalista, fotógrafa, professora, rata de biblioteca e musicista por acidente. Ama viajar e é viciada em chás. É a escritora oficial dos cartões de Natal da família. É Doutora em Comunicação e Linguagens pela Universidade Tuiuti do Paraná (UTP) e atualmente trabalha no seu primeiro livro de poesias.