In memoriam
Era praticamente gente. Só faltava falar. Para descobrir aonde ele estava na casa era só escutar o barulho de suas patinhas caminhando pelo assoalho de madeira: era como sininhos. Vou sonhar com esses sininhos. Companheiro de mais de uma década, ontem partiu meu imperador peludo. Quando pequeno, ele parecia um bicho de pelúcia (e continuou sempre assim). Quando jovem, sempre ativo – corria, fugia de casa, pulava portões. Quando mais velhinho, ele era o Garfield dos cães. Napoleão foi o cachorro mais doce, amoroso e companheiro que se poderia ter. Queria estar sempre junto. Participar de todas as aventuras. Pela manhã ele era meu despertador. Pulava, pulava, pulava incansavelmente na cama. Lambia minhas bochechas. Até conseguir seu intento – que eu acordasse! Era como se ele dissesse: “Vamos lá, está um dia lindo lá fora e você aí, desperdiçando seu tempo dormindo”! Mesmo amoroso, o imperador era um cão de atitude. Quando contrariado, ficava emburrado no seu canto até que alguém fizesse cócegas na sua barriga. Na Melhor Idade, ele adquiriu um alimentação mais balanceada. Era louco por mamão, melão, cenoura. Um cão meio vegetariano. Digo meio, porque ele também não dispensava um bom pedaço de carne. E, quando os passarinhos chegaram na casa, ele enlouquecia… Uma invasão em seu território! Napoleão comandava um império. Todos os dias inspecionava seus domínios – cheirava todas as árvores do quintal, se embrenhava na mata. Era como um cão selvagem vivendo loucas aventuras.
Vou sentir saudades desse companheiro que cresceu junto comigo. Daquela alegria contagiante. Daquele rabo de escovinha e dos olhos que pareciam contas de vidro, de um negro profundo.
Saudades das patinhas andando pelo assoalho de madeira.
E de seus sininhos.