Zalipie: porque a vida é mais bela com flores

Há algumas semanas tive o prazer de visitar um lugarejo encantador no sul da Polônia. Trata-se de Zalipie, uma localidade rural localizada a mais ou menos 100km de Cracóvia, que possui aproximadamente 740 habitantes. Zalipie se tornou famosa pelas suas casas de madeira pintadas com flores. No fim do século XIX, as pessoas ainda utilizavam no campo um tipo de fogão à lenha mais primitivo, no qual a fumaça escapava por um buraco no teto. Como as paredes próximas acabavam ficando com um pouco de fuligem, as mulheres tinham o costume de branquear os pontos mais escuros com cal perto de ocasiões especiais, como o Natal e a Páscoa. Essa prática criava um padrão de manchas circulares mais claras nas paredes.

Segundas as lendas locais, uma moradora mais criativa teve a idéia de cobrir a fuligem com motivos florais, ao invés de simplesmente clareá-la. Outras moradoras acabaram vendo e gostando, e decidiram utilizar a mesma técnica para disfarçar a fuligem. No início, as mulheres pintavam motivos florais modestos, apenas em branco, preto e bege (utilizando cal, fuligem e argila).

Na virada do século, quando as localidades rurais já tinham acesso a um tipo de fogão mais moderno, com chaminé, esse costume acabou evoluindo para um novo estilo de decoração, rico e vibrante em cores. Os moradores de Zalipie passaram a utilizar também na decoração interna de suas casas flores feitas de papel de seda, recortes de papel e aranhas feitas de palha penduradas no teto.

Artistas mais talentosas começaram a pintar esses motivos em papel e, imitando um estilo mais urbano, passaram a pendurar esses trabalhos nas paredes e sobre as camas, lembrando uma tapeçaria. Algumas vezes, algumas senhoras mais ricas até mesmo encomendavam papéis de parede prontos de moças mais pobres, porém muito talentosas.

Com o tempo, começaram também a pintar as paredes externas dos edifícios. Mas não se limitaram a elas, espalhando flores pelos poços, cercas e até nas casas dos animais. Em Zalipie encontramos aproximadamente 20 propriedades rurais decoradas, algumas até em um estilo mais contemporâneo. Em muitas delas, os moradores nos convidam a entrar e podemos ver as tradicionais decorações em papel, recortes, objetos cerâmicos e também roupas e tecidos decorados!

O acervo dos trabalhos das artistas de Zalipie encontra-se na antiga casa de Felicja Curyłowa (1904-1974) – a pintora mais famosa de Zalipie –, que é hoje uma filial do Museu Etnográfico de Tarnów. No momento, o espaço expositivo encontra-se fechado para reformas até o fim de 2018, mas é possível observar as casas externamente.

Desde os anos 1960, é organizado anualmente o concurso Malowana Chata (Cabana pintada) no final de semana logo após o feriado de Corpus Christi. Essa iniciativa busca estimular as novas gerações para que se envolvam na preservação da identidade local, premiando as melhores pinturas em diferentes categorias.

Além da casa de Felicja Curyłowa, em Zalipie encontra-se o Centro Cultural Dom Malarek (Casa das artistas), criado em 1978 com o objetivo de incentivar a manutenção e desenvolvimento da tradição local de decoração das casas. Lá é possível observar passo a passo a técnica de pintura das flores.

Algumas dicas para quem for visitar:
– a melhor época é após o feriado de Corpus Christi, durante o verão;
– chegue cedo nos finais de semana, para evitar as excursões asiáticas (os espaços são pequenos e Zalipie possui uma estrutura limitada para atendimento a turistas);
– é possível visitar a maioria das casas num trajeto a pé que não dura mais que 1 hora. No entanto, acredito que a melhor forma de visitar Zalipie seja de bicicleta;
– não deixe de visitar a igreja e observar as capelas decoradas ao longo das estradas;
– interaja com os moradores locais. Eles realmente parecem ter saído de um conto de fadas!

Casa de Felicja Curyłowa. Felicja Curyłowa’s house.

Capela no interior da igreja de Zalipie. Chapel inside the church of Zalipie.



 

Zalipie: because life is more beautiful with flowers

 

Some weeks ago I had the pleasure to visit a charming village in the South of Poland called Zalipie. It is a rural area located about 100km from Krakow, which has approximately 740 inhabitants. Zalipie became famous for its wooden cottages painted with flowers. In the end of the XIX century, people in the countryside were still used to have a primitive type of stove, from which the smoke escaped through a hole in the ceiling. As the closest walls used to get dirty with the soot, women had the tradition of whitening the dirty spots with whitewash before important events, such as Christmas or Easter. This practice used to create a pattern of lighter spots in the walls.

According to the local legends, a creative woman had the idea of covering the soot layer with painted flower motifs instead of simply whitening it. Other women from the area saw the idea and like it, and decided to use the same technique to cover-up the soot. At the beginning, they used to paint modest flowers, only in white, black and beige (using whitewash, soot and clay).

At the turn of the century, when rural villages already had access to a more modern type of stove with chimney, this tradition evolved into a new style of decoration – rich and full of colour. People from Zalipie had started using in the interior decoration of their homes silk-paper flowers, paper cutouts and spiders made of straw hanging from the ceiling.

More talented artists began to paint these flower motifs on paper and hang these works on the walls over the bed, imitating a more urban style and resembling a tapestry. Moreover, sometimes richer ladies commissioned ready-made wallpapers from poor but skilful girls.

Over time, they began to paint the external walls of their homes. But they were not limited to them, spreading flowers on wells, fences and even on the buildings for the animals. In Zalipie we can find approximately 20 rural properties decorated, a few of them in a more contemporary style. In many, the residents invite us to come in and we can see the traditional paper decorations, cutouts, ceramics, decorated clothes and fabrics!!!

The works of Zalipie’s artists are housed in the former home of Felicja Curyłowa (1904-1974) – Zalipie’s most famous painter. This building is now a branch of the Ethnographic Museum of Tarnów. At the moment, the exhibition is closed for renovations works until the end of 2018, but it is possible to observe the house externally.

Since the 1960s, the Malowana Chata (Painted Cottage) contest is organized annually just after the Corpus Christi holiday. This initiative seeks to encourage new generations to be involved in preserving the local identity, rewarding the best paintings in different categories.

Besides Felicja Curyłowa’s house, we can visit in Zalipie the Cultural Center Dom Malarek (Painters House), created in 1978 with the aim of preserving and developing the local tradition. There, it is possible to see step by step the technique of painting flower motifs.

Some tips for visitors:
– the best time to visit Zalipie is soon after the Corpus Christi holiday, during summer;
– arrive early in the weekends, to avoid big groups of tourists (the spaces are small and Zalipie has a limited structure to serve so many visitors);
– it is possible to visit most of the houses in a walk that does not last more than 1 hour. However, I believe the best way to visit Zalipie is by bicycle;
– be sure to visit the church and observe the decorated chapels along the roads;
– interact with locals. They really seem to have come out of a fairy tale!

Share:
Written by Ca Amatti
Ca Amatti é arquiteta restauradora, apaixonada pelos edifícios antigos, por viagens e artes gráficas. Tem saudades do futuro, mas ama os vestígios do tempo no mundo. Atualmente reside em Varsóvia, protegendo velhos palácios e monumentos dos efeitos devastadores do tempo e do esquecimento.